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Mt 14, 22-33

22Logo depois, Jesus obrigou seus discípulos a entrar na barca e a passar antes dele para a outra margem, enquanto ele despedia a multidão.

23Feito isso, subiu à montanha para orar na solidão. E, chegando a noite, estava lá sozinho.

24Entretanto, já a boa distância da margem, a barca era agitada pelas ondas, pois o vento era contrário.

25Pela quarta vigília da noite, Jesus veio a eles, caminhando sobre o mar.

26Quando os discípulos o perceberam caminhando sobre as águas, ficaram com medo: É um fantasma! disseram eles, soltando gritos de terror.

27Mas Jesus logo lhes disse: Tranqüilizai-vos, sou eu. Não tenhais medo!

28Pedro tomou a palavra e falou: Senhor, se és tu, manda-me ir sobre as águas até junto de ti!

29Ele disse-lhe: Vem! Pedro saiu da barca e caminhava sobre as águas ao encontro de Jesus.

30Mas, redobrando a violência do vento, teve medo e, começando a afundar, gritou: Senhor, salva-me!

31No mesmo instante, Jesus estendeu-lhe a mão, segurou-o e lhe disse: Homem de pouca fé, por que duvidaste?

32Apenas tinham subido para a barca, o vento cessou.

33Então aqueles que estavam na barca prostraram-se diante dele e disseram: Tu és verdadeiramente o Filho de Deus.


HOMILIA DO 19º DOMINGO DO TEMPO COMUM

           Com as celebrações deste final de semana a Igreja no Brasil abre a semana nacional da família, e tendo presente a vocação sublime que Deus deu a muitos aqui presentes de serem pais e mães de família, hoje podemos aproveitar a ocasião para pensarmos como esta palavra que acabamos de ouvir pode ser um referencial, seja para aqueles que já constituíram uma família, como para aqueles que também estão a caminho dessa constituição e por meio do Sacramento do Matrimônio tomarão uma nova visão do mundo a partir de uma constituição sacramental.

            É assim que eu gostaria que pudéssemos perceber que na liturgia deste final de semana há algumas conotações quanto à manifestação de Deus na história e na vida familiar. Em algumas situações de manifestações de Deus, Ele assim se manifesta por meio de trovões, tempestades, e de forma que muitas vezes o próprio vento fora uma manifestação de Deus, mas eis que depois deste tempo de ventania, tempestade, de fogo, Deus se manifesta também na calmaria, e na leve brisa, como nos aponta a primeira leitura de hoje.

           Se assim pensarmos, logo perceberemos que dentro da família também experimentamos situações em que somos convidados a enfrentar tempestades e ventos, em vista de uma grande calmaria. Talvez nem experimentemos, aqui na terra, essa calmaria ou essa leve brisa, mas o importante está em nos lançarmos à procura de Deus para que dentro destas manifestações Dele percebamos a sua presença, assim como aconteceu no monte Sinai.

       Para Moisés, Deus, quando falava, se manifestava até mesmo com trovões, eram manifestações de que Deus estava ali presente falando com Moisés, mas para Elias, outro profeta no mesmo monte de Deus, como é que Deus se manifestou? Numa leve brisa. Diz o livro dos Reis que ele foi até este monte para estar na presença de Deus, então começou um vento impetuoso e forte, Deus não estava neste vento, esse vento era muito grande, esse vento era contrário, e veio inclusive um terremoto, mas o Senhor não estava no terremoto, passado o terremoto veio o fogo, e o Senhor não estava no fogo, e depois do fogo ouviu-se um murmúrio de uma leve brisa, ouvindo isso, Elias prostrou-se por terra e disse: estou na presença de Deus.

        Vejam que diante das grandes manifestações de tempestades, de terremotos, Deus se manifesta e o próprio Elias precisou perseverar em meio a estas situações para experimentar a calmaria e a leve brisa.

              De modos diferentes e no mesmo monte, Deus se manifestava para Moisés e para Elias e os convidava para que pudessem perceber que estavam na presença de Deus.

               Agora, se aplicarmos essa leitura e se aplicarmos o evangelho de hoje que fala também de tempestades, de ventos, de Jesus que está com os discípulos, logo perceberemos que há uma relação muito próxima com a nossa família ou com as pessoas que Deus colocou junto a nós. Não estamos e nunca estaremos numa família perfeita, por mais que desejemos. Desejar ser uma família perfeita é uma coisa, ter consciência da realidade da família é diferente. Os dois polos é que nos indicam realmente que estamos em busca da perfeição.

               Não somos verdadeiramente os pais que deveríamos ser. Na relação dos filhos com os pais nem sempre se dá uma relação cheia de afeto, de companheirismo, mas mesmo em meio a essas situações Deus também pode se manifestar. Se tantas vezes nascemos dentro de uma família em que impera, infelizmente, guerras interiores de pais e até externas de brigas constantes, poderíamos hoje ter a certeza de que Deus pode prover o melhor.

           De que forma, mesmo em meio a tantas tempestades e terremotos, Deus pode se manifestar?  Quando encontrar um refúgio seguro em um coração que possa temer a Deus. Estou dizendo isso para termos consciência que pertencer a uma família exige transformações constantes. Como filhos nos transformamos, como pais e mães também há uma transformação e como é bom até mesmo perceber que cada um de nós já teve  uma relação boa ou má com nossos pais. Como é bom percebemos Deus está agindo e colocando sinais para que muitas vezes enxerguemos os nossos pais e também nós nos transformando.

                 Eu me lembro bem dos meus pais que viveram juntos cinquenta e cinco anos, com muitas dificuldades, desde financeiras e  até mesmo de relacionamento, mas puderam perseverar e eu só pude perceber como havia um grande amor entre os dois. depois da morte do meu pai. Percebi o quanto que me minha mãe o amava, o quanto que para nós, filhos, era um sofrimento muito grande perder um pai, mas para a esposa perder o marido era um sofrimento que não tinha como descrever.

                 Assim entendi o valor real que Deus colocou em cinquenta e cinco anos de perseverança. O modo como eles não eram de demonstrar muito afeto um com o outro, mas como se amavam e é este amor que fez os dois perseverarem por cinquenta e cinco anos e depois permitiu que minha mãe pudesse se reestabelecer e vivesse mais onze anos depois da morte do meu pai, embora já estivesse com uma saúde bem debilitada.

                Vejam como é importante percebermos que há transformações na vida. Hoje, na capela, eu partilhava outro aspecto da minha vida familiar, mas aqui me veio à mente justamente a relação que existe entre pais e filhos. Percebendo as dimensões de crescimento, hoje eu com quarenta anos, consigo visualizar muito bem quantas situações de precariedade sentíamos com a ausência do pai ou da mãe, mas também quanta presença.  Quantas vezes, e eu me lembro muito bem da minha infância, no interior era muito comum participar das variadas celebrações do terço em família, e quando chegava para rezar o terço numa família e eu era bem criança, o pai conseguia me colocar no colo. Mas como era bom fingir que já estava cansado e dormindo para que o pai pudesse me carregar porque assim sentia a presença calorosa dele. Às vezes não estava dormindo mesmo, mas ele me pegava no colo e me levava até em casa e me colocava na cama com a ternura de um abraço caloroso de pai.

                 E hoje sou feliz, graças a Deus, e sou feliz pelos meus pais, especialmente pelo meu pai, porque colocaram limites na minha vida, pois às vezes as verdades precisam ser ditas a uma criança, e existem formas educativas de se fazer isso. O meu pai era bastante rígido neste aspecto, se ele dizia não, era não, não tinha negociação, e como foi importante dizer não naquelas ocasiões, porque hoje a ausência de um não ou de limites na relação com os filhos está levando muitos jovens a se perderem neste mundo.  Se dentro de casa não conseguimos colocar limites para os filhos onde é que eles vão encontrar limites? No mundo.  O mundo vai impor limites, e algumas vezes esses limites são trágicos. Infelizmente em meio a dores que não podem fazer parte de uma família, mas que é consequência de ausência demasiada de relação afetuosa, de uma relação próxima que não precisa ser violenta, de modo algum, não precisa brigar e não precisa apanhar de forma que se sinta violentado, mas umas boas palmadas fazem muito bem.

                Levei algumas palmadas da minha mãe, nem sei quantas foram, perdi a conta, mas foram muitas e, chineladas também.  Às vezes eu escondia o chinelo, mas não adiantava, porque tinha outros meios. Se não tivesse acontecido isso, uma ou duas vezes, acho que foram duas, que eu apanhei do meu pai, mas duas vezes que eu não esqueço nunca, porque apanhar do pai é mais duro. Não faz mal dar limites ao filho, é um bem que fazemos aos nossos filhos. Evidentemente que o modo de educar é diferente de dez, quinze anos atrás, imagine cinquenta anos atrás, é preciso que saibamos que a educação é uma arte, arte que passa também por uma transformação.

                 Vejo, por exemplo, o modo como eu e meus irmãos fomos educados pelos nossos pais e como meus irmãos se transformaram, também são pais de família e educaram seus filhos também com limites. Agora os filhos deles também estão educando e há algumas transformações que precisam ser feitas, até mesmo para que não tenhamos como herança formas violentas de educação.

                 E aqui parto para a conclusão, mesmo em meio às tempestades da vida, mesmo em meio às situações que nem compreendemos o porquê, depois vem um tempo de calmaria. Se no tempo dos discípulos veio uma tempestade em alto mar e Jesus que estava o tempo todo com eles segurou a Pedro,  depois veio a calmaria porque  eles souberam enfrentar as tempestades.  

         Concluindo, enfrentamos tempestades neste mundo e nesta vida e um dia iremos experimentar uma brisa suave.

                Graças a Deus experimentei isso muitas vezes com meus pais. Depois dos sessenta anos meu pai  teve que deixar de beber e  fumar e  como   isso  era o que o deixava  mais violento houve uma  transformação e mudança impressionante.  Herdamos dele a força de vontade, pois quando decidiu que não fumaria e nem beberia mais, nunca mais fez isso, nem precisou de tratamento, a não ser a própria força que teve.

               Mas depois dos sessenta, ele viveu até os setenta e cinco anos, foram quinze anos em que na verdade, no seio familiar, estava apenas eu em casa. Como sou o último filho, o caçula, alguns dizem que fui o mais mimado.  Não sei se fui ou não, mas como era só eu, meu pai e minha mãe quantas vezes experimentamos essa calmaria. Meus pais também experimentaram isso, claro que os filhos também proporcionaram, mas era evidente para os meus irmãos e eles muitas vezes testemunharam isso: o quanto mudou a relação com meus pais.  

            Quando entrei para o seminário, e logo depois um dos meus sobrinhos também, os encontros com os pais e famílias que tinham vocacionados para a vida sacerdotal, transformou a vida deles.  Quantas transformações vejo também nos pais dos sacerdotes, inclusive, uma das minhas irmãs disse o seguinte: o meu pai se tornou outra pessoa depois que você entrou no seminário. Depois que ele começou a frequentar este ambiente de famílias que estavam experimentando o gosto de ter um vocacionado no seio familiar, mudou completamente com minha mãe e com os outros filhos, e foi assim que ele se transformou, completou a corrida, guardou a fé.  Com setenta e cinco anos, de forma repentina, quase da noite para o dia, passou mal e Deus o chamou, estava em paz porque cumpriu a missão.

              Assim, eu partilho com vocês para que compreendamos a dimensão importante do afeto  que existe entre pais e filhos e o quanto precisamos nos transformar, não importa se temos setenta, oitenta anos, há muita transformação a fazer, se temos dez, quinze, muitas transformações a serem feitas também na vida, e é assim que venceremos as tempestades, os ventos, o fogo, e teremos uma leve brisa diante dos nossos olhos, se não completa neste mundo, a leve brisa da presença de Deus quando estivermos  face a face com Ele.  

Este texto foi transcrito, com algumas adaptações, da homilia proferida pelo Pe. Maurício na missa das 10:30h do dia 13/08/2017. Não passou por uma revisão gramatical e ortográfica profunda, mantendo a linguagem coloquial original

Escrito por: Pe. Maurício